P.MAURICIO CRAVOTTO COMO REFERÊNCIA URBANISTICA


                    Maurício Cravotto, (1893-1962) uruguaio que se tornou marco cultural da arquitetura e do urbanismo no continente latino americano no inicio do século XX nas décadas de 20 a 50.

Os primeiros escritos sobre a arquitetura uruguaia, mereceram ser reproduzidos pela revista Arquitectura do Colégio de Arquitetos de Madrid em 1920, neste contexto destacamos o surgimento da preocupação de Maurício Cravotto, que em 1917, ainda estudante,reconheceu com respeito às qualidades urbanas e arquitetônicas de Colônia de Sacramento, através de artigo publicado.

Cravotto é um dos principais promotores desta realidade diferenciada que surge no Uruguai da «arquitetura renovadora», com um brilhante avanço na modernidade, levada a frente por uma fecunda e dinâmica geração de arquitetos.

A produção arquitetônica de Cravotto se insere na preocupação dominante da modernidade, mesmo que ela não se prenda na preocupação do discurso da própria realidade nacional, como sua extensa área urbanística.

Cravotto, que inicialmente se relacionou com as formulações urbanísticas francesas (guardava anotações conferencias de Leon Jaussely e valorizava o pensamento de Marcel Poëte) e após viagem de estudos aos Estados Unidos e Canadá e da sua passagem pela Inglaterra em 1918, trabalhando entre 1919-1921 na Europa tomou conhecimento das novas propostas da renovação urbanística no caso se incluem a escola alemã, reformulando e se adaptando à suas metodologias.

A década de 20 confirma as tendências urbanas sugeridas no período anterior. O Palácio Salvo começa a ser construído (1922-1928) sobre a Plaza Independência e a avenida 18 de Julio, iniciando a "verticalização" da cidade com uma referência urbana ainda hoje presente.

As normas de higiene (1928) que habilitam as novas tipologias de habitação são modificadas pelo Plano Fabini (1928) e pelas primeiras operações de seção da trama viária (avenida de la Agraciada).

Plano Regulador de Montevidéu (1930) de Mauricio Cravotto, parte da realidade urbana e tenta organizar uma visão através do projeto a importância de certas operações de renovação, para valorizar as condições essenciais da vida urbana, antes que se tornem composições cenográficas. Tratava-se definitivamente das metodologias, conceitos diferenciados de cidade e urbanismo.

Em 1930, o plano para uma cidade de 3 milhões de habitantes (arq. Mauricio Cravotto) constitui a primeira expressão de negação da cidade existente.

O período de hegemonia do art déco (1925-1935), habilita o ingresso definitivo da corrente arquitetônica renovadora em nosso meio e o predomínio da cidade balneária que impregna este período promove a construção das Ramblas Sul, Ramirez e Pocitos, proporcionando importância urbana à costa sudeste da cidade.

Nestes anos, a localização descentralizada da Cidade Velha com relação ao desenvolvimento de Montevidéu, como também a utilização quase exclusiva da área da baía para serviços portuários, consolida a paulatina descaracterização daquela primeira fisionomia integradora "baía-cidade".

 A tendência em direção à uma especulação funcional destinada ao setor terciário, foi acompanhada pela perda da população estável (as famílias residentes na Cidade Velha emigram em direção à costa leste da cidade) e por uma lenta e crescente degradação física, produto da substituição social de seus habitantes. O novo espaço dinâmico de desenvolvimento urbano é construído através da rambla de los Pocitos: a cidade do século XX ignorou radicalmente a cidade mediterrânea e a da baía.

Em 1956, é aprovado o primeiro Plano Diretor para a cidade, de acordo com as idéias sugeridas no plano de 1930. A ampliação parcial de sua ideologia essencialmente CIAM (o plano nunca será aplicado como pensamento totalizador), modificará as qualidades da cidade existente.

Mantinha  contato freqüente com o Brasil, fundamentalmente com o Engenheiro Edvaldo Paiva, sobre o Plano de Porto Alegre e de varias cidades menores do estado do rio Grande do Sul juntamente com o engenheiro Ubatuba de Faria que também fora aluno de Cravotto no Instituto de Urbanismo de Montevidéu em 1941.

A importância do Instituto de Urbanismo e da Faculdade de Arquitetura da Universidade da republica do Uruguai que teve neste período, foi conseqüência do trabalho de Cravotto,que projetou no exterior o prestigio da instituição.Estudantes do Paraguai, Chile, Brasil, Equador e Filipinas vinham estudar em Montevidéu e particularmente aprofundar os estudos urbanos com Mauricio Cravotto que ministrava cursos em Buenos Aires, Rosário e Porto Alegre e conferencias no Rio de Janeiro, sobre urbanismo.

Os  trabalhos de Cravotto, como o Anteprojeto do Plano Regulador de Montevidéu de 1930, deram a ele projeção universal a partir de uma edição publicada sobre urbanismo de Alberto Sartoris na Itália,deram ao seu projeto  uma nova dimensão internacional.

Em 1940 participa do concurso do Plano de Mendonza,a equipe  era integrada por Fermín Bereterbide, Belgrano Blanco, Mauricio Cravotto e Juan Sasso, para formulação de um “Plano Regulador,Reformador e de Extensão” com uma proposta de solucionar problemas na área central da cidade com a presença de sistema ferroviário(vias,estacionamentos e depósitos de carga),assim com os sistemas financeiros e critérios de expropriação e destino das terras das estradas de ferro.

A equipe devia durante o tempo de seu trabalho assessorar o município em seus variados aspectos que estes demandavam (expropriação de terra, localização de edifícios públicos, recuperação de espaços verdes, soluções de conexão como os  “Portones” do Parque General San Martin,). Diante destas solicitações  os urbanistas propuseram entregar em julho de 1941 no lugar do Projeto Urbano um Pré-Plano que permitiria às autoridades municipais uma ação executiva imediata para articular as novas demandas propostas básicas dos planejadores ,o que aceito pela comunidade.

No Pré-Plano a equipe apresenta uma publicação com páginas, planos e textos gráficos onde se apresentam os aspectos substanciais da  proposta:assentamento geográfico, base econômica,histórica e humana;modos de produção;correntes de circulação;relação entre cidades e regiões;aglomerações urbanas,moradias;espaços públicos;equipamentos;aspectos legais e financeiros;política territorial;unidades de vizinhança, assim como centros culturais.

A preocupação pela paisagem, pela identificação das fontes de riqueza e potencialidades de Mendonza como capital administrativa e do governo, como centro turístico, como centro de industria vinícola e  áreas residenciais se explicavam no Pré-Plano que atacava os aspectos deficitários em matéria de abastecimento de água potável ,de saneamento e edifícios de moradia.Neste contexto se abordava a proposta da cidade futura.

Sua formulação partia de uma definição doutrinaria do urbanismo humanista que postulava que “ um plano regulador não é um só código nem um plano.É um pensamento coordenado, para reagir as múltiplas e complexas contingências da vida humana na coletividade”.

Diante disto surgiram às propostas fundamentais:
- Uma hierarquia na participação da paisagem e das florestas.
-A necessidade de preservar áreas de vinhedos de um crescimento desordenado da cidade associada à idéia de aproveitar para instalar novas áreas residenciais da zona árida da colina,aonde se formava o Parque San Martín.
- edificações com núcleos de convivência econômica com uma área urbanizada nos “Los Ciruelos”.
- Destinar para edificar o Centro do Governo Provincial na área da quinta Agronômica para o Centro Municipal.
- A extensão da cidade sobre as áreas dos municípios vizinhos (Guayamallén e Godoy Cruz) como previsão do futuro”par um contingente de seiscentos mil  almas( notar que se faz referencia para almas e não para habitantes, um pouco por tradição e muito simbolismo) para não lesionar as zonas de vinhedos.
- Novos núcleos de vizinhança que  configuram como pequenos centros de vida coletiva parcial” com áreas de verdes.
- edificação para a Universidade de Cuyo, o Teatro al Aire Libre e a localização do novo aeroporto, que apontava a limitação da expansão urbana.
O Pré-Plano propunha edificações para  o centro do Governo,o Centro Municipal,Centro religioso,Centro Hoteleiro e do Vinho e o Centro Histórico de Cuyo,assim como volumetrias e sugestões nas artes plásticas.
O pré-Plano com que se pretendia iniciar uma obra de persuasão para preparar as possível execução do Plano Regulador:
- Definindo aspectos fundamentais que uma vez realizado o expediente urbano realizar o Plano do Governo.
- Novo código de edificações e parcelamento
- Estabelecer etapas para a execução das obras do plano
- Destacando finalmente como fundamental ”que ação do governo deveria seguir em paralelo com a ação popular sem a qual não é possível empreender a  mais patriótica obra construtiva dos nossos tempos”

A apresentação do Pré-Plano ratificou a valorização do governo de Mendonza que teria a seriedade profissional e acadêmica de seus urbanistas, os quais  teve apoio de diversos profissionais sobre  a postura do governo inclusive de Carlos M..Della Paolera, um dos antigos concorrentes do concurso de  1940.

Mauricio Cravotto começou a enfrentar problemas na concepção do Pré-Plano com relação aos políticos do governo central.Estes tinham como idéia que (“ Estado Forte” e prestigio para “Obras Públicas”, onde a vontade e o imaginário neofascista da II Guerra estavam relacionado  a muitos políticos).

Os aspectos ideológicos aparecem muito marcantes a partir “... de reconhecer que a mais valia dos terrenos privados, conseqüentemente a obra pública, necessita a base sólida dos valores imediatamente anteriores a iniciação das obras oficiais de melhoramentos”.

No Plano Regulador  as idéias da equipe tomam doutrinariamente a distancia com o antigo urbanismo academicista ao ratificar-se “... a obra de arte urbanística não é primariamente ornamental e sim funcional,espacial e plástica a serviço de uma digna concentração da vida humana”.

O Plano incidia em precisão sobre os sistemas viários e transportes, e as redes de águas e serviços, as edificações dos edifícios públicos, ao aproveitamento dos espaços livres e formulava uma crítica ao Regulamento das Construções em vigência.

Em 1942 realizou-se uma exposição com painéis e maquetes na Casa de Mendonza em Buenos Aires, onde Cravotto enfatizaria não somente os aspectos técnicos, mas a doutrina de trabalho como urbanista na sua palestra: “O problema urbanístico é um problema fundamental de concentração arquitetônica e espacial que não se deve desconhecer jamais que o primeiro componente é o ser humano,a quem deveremos  estruturar moradias coletivas em um equipamento perfeito para seu trabalho e seu descanso,  assim como espaço físico e espiritual, tão adequados e belos que fomentem a superação da sua razão e sua sensibilidade”.

A revolução militar de 4 de junho de 1943 e com a ascensão do peronismo  ao poder em 1945, interrompe-se a realização integral do plano e corta as comunicações de Bereterbide (protagonista de um episódio conflituoso com Perón em 1948) com os colegas uruguaios .Algumas das obras publicas foram encaradas pelo arquiteto Belgrano  Blanco que participou individualmente ,mas acabou desconsiderando  as diretrizes do plano.

O Plano Regulador de Mendonza foi provavelmente o instrumento urbano, na sua época, que demonstrou a viabilidade do trabalho de um grupo internacional comungando as mesmas idéias, uma solidária predisposição para o pluralismo e capacidade técnica e doutrinaria com a que Mauricio Cravotto apresentou a seus companheiros de equipe.

Em 1944, o norte americano Francis Violich, autor do primeiro livro sobre cidades latino americanas, escreveu sobre a surpresa dos conhecimentos e da qualidade de estudos realizados por Cravotto no Uruguai, destacando a importância do Instituto de Urbanismo da Faculdade de Arquitetura, que apresentava  trabalho de pesquisa sobre centros urbanos.

Um projeto urbanístico se impõe com instrumento poderoso, mas também como legítimo.A sua legitimação como projeto urbano têm uma abrangência política.As circunstâncias políticas e os acontecimentos que estão na sua origem contam tanto ou menos a que darão  ao nascimento ou criação.O  poder  vai estabelecendo e  se apropriando do projeto urbano com suas referencias técnicas, tornando-se um instrumento político de ocupação do poder já existente.

As questões simbólicas do Projeto Urbano de Atlântida, está ligada ao Departamento Balneário Marítimo, que a sociedade da época produziu e são ilimitados.A legitimidade do poder passa obrigatoriamente por um projeto, que se vincula pela ocupação do Litoral Norte aliado a um promissor e nascente mercado imobiliário com a participação de empresas consorciadas para o desenvolvimento econômico e social daquele período: O poder estabelecido protegeria a sua legitimidade contra aqueles que poderiam contradizer, quanto ao mérito como componente de proposta de desenvolvimento político econômico e social, necessário para a época.Imaginar uma contra legitimidade, um poder fundado numa legitimidade diferente daquela que se reclama a dominação estabelecida, é um elemento essencial do ato de pôr em causa a legitimidade do poder[1].



[1]             BACZO, op.cit.,pg 310

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