Anexo III . ESTUDO DA PAISAGEM DO IMBÉ
A paisagem do Imbé
Me, Bióloga Bianca Spindola
Imbé faz parte do Litoral Norte do Rio Grande do Sul
e sua economia está associada à atividade turística de veraneio, o que confere
a região características de grande variação sazonal da população e intensa
urbanização. Por
esse motivo, muitas vezes, a dinâmica desse ambiente, assim como a flora e
fauna, passam despercebidas pelas pessoas que só veraneiam ou até por aquelas
que residem no litoral.
A paisagem do litoral gaúcho é constituída pelas
praias marinhas, dunas, lagoas doces e salobras, encostas da serra e pelos
banhados. Todos esses ecossistemas fornecem um valor paisagístico único. O Rio
Grande do Sul, entre os estados atlânticos do Brasil é o que possui o litoral
mais uniforme, e nele os maiores lagos do país.
O litoral rio-grandense apresenta vários caracteres
peculiares. Existe uma uniformidade de estrutura em toda a sua extensão, com
exceção a Torres; há um paralelismo de disposição evidente dos elementos da
paisagem, já que tudo se orienta em direção sudoeste-nordeste e por último a
multiplicidade de coloridos produziu uma paisagem exclusivamente rio-grandense
que não há similar em todo o Brasil (1).
A paisagem litorânea é alterada freqüentemente, seja
pela interferência direta ou indireta do homem ou por fatores físicos, químicos
e/ou biológicos. As zonas costeiras são afetadas pelas mudanças do clima e do
nível do mar, além da exploração pelo homem, que leva ao declínio gradativo dos
recursos em diversas escalas, principalmente na escala regional. Entre as
atividades do homem que alteraram consideravelmente a paisagem do litoral,
através do desmatamento, bem como por drenagens, destacam-se: criação de gado,
plantação de arroz e grandes extensões de monocultura de eucaliptos e de Pinus.
A vegetação
A
delimitação real dos domínios da Mata Atlântica tem gerado muitas discussões.
Originalmente, se estendia do Ceará ao Rio Grande do Sul e praticamente
acompanhava todo o litoral brasileiro, cobrindo 1.306.421 km2 do
território; atualmente, restam 8% do bioma original (2). A Mata Atlântica é constituída por florestas
de planície e de altitude, matas costeiras e de interior, ilhas oceânicas e
ecossistemas associados, como restingas, manguezais e campos de altitude.
A ocupação estrangeira do território brasileiro
se deu pela costa, através de um pensamento de conquista e uso de um número
máximo de recursos, sem nenhuma pretensão de conservação e manejo e sim
atendendo a evolução econômica.
Mesmo restando tão pouco da
cobertura original, a Mata Atlântica ainda é uma das florestas com maior
biodiversidade do mundo. Muitas espécies
ameaçadas de extinção e/ou endêmicas dependem desse bioma para a sua
sobrevivência e conservação.
A vegetação que observamos atualmente na faixa
litorânea em Imbé pertence à restinga, que é um ecossistema associado à
Mata Atlântica. No entanto, a forte pressão antrópica e o aumento da
urbanização fizeram com que restassem poucas áreas com condições favoráveis ao
estabelecimento e a conservação da vegetação. Mesmo assim, em algumas faixas de
dunas no Imbé ainda podemos avistar a flora e a fauna associada que
fazem parte da restinga.
As
areias litorâneas oferecem um substrato desfavorável à vida vegetal. Alguns
fatores dificultam o estabelecimento de vegetais na planície litorânea. Entre
eles: a areia é pobre em substâncias nutritivas para as plantas, a
permeabilidade quanto a água é alta, há uma quantidade de sal marítimo que
imobiliza grande parte da água infiltrada, o calor do sol é intenso e faz
evaporar a umidade das camadas superficiais, o vento causa um impacto nas
partes aéreas dos vegetais e é o principal responsável pela mobilidade das
dunas, que muitas vezes acaba soterrando regiões nas quais vegetais conseguem
se fixar(3).
No
entanto, mesmo com todos esses fatores que dificultam a fixação e a
sobrevivência dos vegetais nesse ambiente, a natureza sempre se mostra
desafiadora. Existem espécies vegetais
tolerantes e adaptadas a essas condições. Algumas características fisiológicas
e/ou morfológicas na planta podem aumentar a sua tolerância, como por exemplo:
ser suculenta, apresentar abcissão foliar, possuir um reduzido número de
estômatos, e apresentar glândulas de excreção de sal, entre outras.
A
vegetação de restinga é bastante complexa e vai desde tipos herbáceos até arbustivos
e arbóreos. As dunas podem ser divididas em primárias (antedunas), secundárias
e terciárias. As dunas primárias constituem uma comunidade pobre na riqueza de
espécies, formada basicamente por Paspalum
vaginatum, espécie extremamente tolerante à salinidade. Nas dunas que se
estendem paralelamente à costa, as secundárias e terciárias, há uma diversidade
mais elevada onde comunidades diferentes alternam-se devido a maior ou menor
influência do lençol freático (4). Espécies como Hydrocotyle bonariensis e Panicum racemosum são características
nessas dunas.
As
dunas secundárias e terciárias possuem um papel ecológico importante na
formação e na fixação das dunas costeiras, já que apresentam adaptações ao
contínuo soterramento pela areia transferida pelo vento (5). No
entanto, apenas uma faixa pequena da planície litorânea em Imbé ainda possui
dunas secundárias e terciárias, estas foram substituídas por calçadões e por
construções de quiosques, casas e etc. Mesmo assim, em função da fragilidade
dos ecossistemas de restinga, a vegetação que existe, exerce um papel
fundamental para a estabilização dos sedimentos e a manutenção da drenagem
natural, bem como para a preservação da fauna residente e migratória associada.
A fauna
O
Rio Grande do Sul tem uma importância ecológica mundial no que diz respeito às
aves migratórias. Além destas, muitas aves residem na costa litorânea, e podem
ser vistas com facilidade em Imbé.
Algumas espécies que ocorrem no Imbé estão organizadas numa lista
(Tabela 1).
A
listagem a seguir teve como base o material elaborado pelo Ceclimar e pela
UFRGS (Aves de Imbé-Litoral Norte/RS), tendo sido este revisado e atualizado
com base na lista proposta pelo CBRO (Comitê Brasileiro de Registros
Ornitológicos) 2006, Listas de Aves do Brasil. Versão 10/02/2006. Disponível em
http://www.cbro.org.br Acesso em {25/04/07}.
Além destas aves citadas na lista,
algumas aves marinhas pelágicas migram para o litoral gaúcho, como albatrozes,
petréis e pingüins.
Em relação aos cetáceos, grupo
representado por baleias, botos e golfinhos, até o momento, é conhecida a
ocorrência de 42 espécies para o Brasil, sendo que o Rio Grande do Sul é a área
com uma das maiores diversidades do país. Atualmente, são registradas 34
espécies para a água do Estado, o que representa 80% de todas as espécies do
país. No entanto, muitas dessas espécies não são avistadas por serem oceânicas (6).
As espécies de cetáceos mais
freqüentemente encontradas são Pontoporia blainvillei (toninha),
Tursiops truncatus (golfinho-comum), Eubalaena australis (baleia-franca)
e Delphinus delphis (delfim-comum) (7).
Entre os pinípedes, as espécies
mais observadas são Otaria flavescens e Arctocephalus tropicalis,
principalmente durante o outono e a primavera (8). Os
outros pinípedes são visitantes ocasionais.
·
Relação pescador-boto-tainha no estuário do Rio Tramandaí
Entre Tramandaí e Imbé,
no Rio Tramandaí e no Rio Mampituba, existe uma forte cooperação entre o homem
e os botos, os pescadores se introduzem no mar até a cintura, enquanto o boto
ecolocaliza o cardume e o conduz até próximo à costa, avisando do melhor
momento para o tarrafeio (9). Essa interação, entre os pescadores e
os botos, pode ser vista acontecendo com uma certa facilidade na barra; de um
lado os homens possuem sucesso na pesca e por outro, os botos aproveitam as
tainhas que escapam da rede. A pesca é
altamente ritualizada e parece envolver comportamento aprendido tanto no homem
como no delfim. Pesca especializada culturalmente transmitida. Os estuários
funcionam como regiões de reprodução e crescimento para muitas espécies de
peixes, que se beneficiam das condições de “abrigo” e da disponibilidade de
alimentos.
Conservação
Estamos
vivendo uma crise ambiental mundial, ao mesmo tempo, há um crescente
comprometimento para resolver os problemas atuais. Dessa forma, devemos pensar
num gerenciamento costeiro de qualidade, na qual esteja incluído o manejo
adequado de todos os recursos naturais, para que haja uma redução da ameaça a
flora e a fauna, possibilitando dessa forma uma vivência mais harmônica do
homem no litoral. Esse gerenciamento deve ser pensado de forma a conservar a
biodiversidade e respeitar o habitat na qual estamos inseridos e dependemos
dele para uma boa qualidade de vida.
Para que possamos usufruir o que a paisagem
nos proporciona e utilizar os recursos naturais do litoral gaúcho por muitas
gerações, é necessário que haja conhecimento científico, consciência e
gerenciamento. Para isso, devemos buscar as conexões responsáveis pela
manutenção do ecossistema; pensar na conservação em escala apropriada, ou seja,
não apenas em conformidade com as fronteiras políticas estabelecidas pelos
governos; reconhecer que o ser humano faz parte dos ecossistemas e que valores
humanos influenciam a conservação ou destruição dos ecossistemas.
Algumas medidas podem
ser feitas para ajudar na conservação do litoral, como a limitação de extração
de recursos naturais, controle do lançamento de resíduos, do uso do solo e etc.
Devemos juntar esforços na conscientização (educação ambiental), na
fiscalização (leis cumpridas) e na pesquisa científica para a melhor
compreensão da estrutura, na composição da flora e fauna, das interações entre
o homem e o meio ambiente.
NOTAS
1-
RAMBO, B. A
fisionomia do Rio Grande do Sul. 2°ed. Porto Alegre: Selbach, 1956.
2-
SCHAFFER,
W. B.; PROCHNOW, M. (Orgs). A Mata Atlântica e você: como preservar, recuperar e
se beneficiar da mais ameaçada floresta brasileira. Brasília,
APREMAVI, 2002.
3-
Ver nota 1.
4-
PFADENHAUER , J. & RAMOS, R.F.. Um complexo de
vegetação entre dunas e pântanos próximo a tramandaí-Rio Grande do Sul, Brasil.
Iheringia, ser. Bot., Porto Alegre, 1979.
5-
Ver nota 1.
6-
FONTANA, C.S; BENCKE, G..A; REIS, R.E. (Org). Livro
Vermelho da fauna ameaçada de extinção no Rio Grande do Sul. EDIPUCRS,
Porto Alegre, 2003.
7-
SEELIGER,
U., ODEBRECHT, C. & CASTELLO, J.P. (Eds). Os ecossistemas Costeiro e
Marinho do Extremo Sul do Brasil. Editora Econscientia, Rio Grande,
1998.
8-
Ver nota 7.
9-
TABAJARA,L. Aspectos
da relação pescador-boto-tainha no estuário do Rio Tramandaí-RS. In: Botos
do Rio Tramandaí. Prefeitura Municipal de Tramandaí/ Universidade Federal do
Rio Grande do Sul. 76 p., 1992.


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